Letras do Brasil

POR THOMAS TOSCANO

Poucos acompanharam a carreira do Rei Pelé tão de perto quanto o repórter José Maria de Aquino. Hoje com 89 anos, viveu na mesma geração que o ídolo santista e conseguiu capturar bastidores das várias fases de sua carreira. Uma das mais intrigantes, a ida de Pelé para o New York Cosmos, teve a cobertura próxima do repórter carioca.

A história começa um ano antes, em outubro de 1974. O Rei se despedia dos gramados pela primeira vez, com direito a volta olímpica na Vila Belmiro. Mesmo com 34 anos e muita lenha para queimar, Pelé havia decidido parar no auge e, assim, ter mais tempo para se dedicar à família e aos negócios. Mas, para a surpresa de muitos, no ano seguinte ele assinou por três anos com o Cosmos de Nova York.

Os motivos principais eram dois: incentivar o crescimento do soccer, como é chamado o futebol nos Estados Unidos, e garantir segurança financeira para sua família, como também para seus negócios e ações beneficentes, como a Fundação Pelé, que sonhava criar. Todos procuravam entrevistar Pelé nas vésperas da ida do craque, mas só José Maria de Aquino conseguiu a exclusiva. Além de explicar suas razões, o Rei contou de outras propostas que recebeu ainda no Santos.

“O primeiro foi em 1971, quando o Santos excursionava pela Jamaica e eu já estava falando em deixar a seleção brasileira. Não sei quem me procurou, mas a conversa já era para ajudar a implantação do futebol nos EUA”, disse o Rei a Aquino. “Eu queria sentir, ter certeza de que estava fazendo um bem para mim, para minha família e para meus amigos. É mentira que pedi iate e outras bobagens, não sou disso. Exigi, isso sim, a Fundação Pelé (…)”

A volta inesperada aos gramados provocou estranhamento nos fãs que pediam, em 1974, que o Rei não parasse de jogar. Muitos desejavam que Pelé disputasse a Copa do Mundo de 1974, mas ele próprio não tinha certeza de sua condição física. Entretanto, para assinar com o Cosmos, preocupou-se mais com a opinião da família do que com a opinião pública.

“Todo mundo sabe que Pelé sempre jogou sério. Ninguém imagina que os americanos paguem uma fortuna para ele brincar de jogar. Os torcedores de lá, que já não são tão fanáticos pelo nosso futebol, não aceitariam um enganador”. Conta José Maria de Aquino no livro Minha Vida de Repórter , de Letras do Brasil, que traz bastidores dos mais de 40 anos de carreira do jornalista. Pelé voltava para entregar tudo o que tinha e encantar novos públicos. E o fez.

Segundo o livro e as belas histórias do repórter, Pelé teve de manter-se no peso de atleta e correr bastante para seguir como titular. Na liga americana, outros astros como Beckenbauer e Eusébio vieram encerrar suas carreiras, até Cruyff, talvez seguindo o exemplo de Edson Arantes do Nascimento, saiu da aposentadoria para voltar a jogar em gramados yankees. Mas era o eterno camisa 10 que os torcedores queriam ver.

Desde sua estreia, promoveu vários recordes de público, chegando a bater 77.691 em um jogo, o que é até hoje o maior número de pagantes numa partida nos EUA. O New York Cosmos fechou as portas em 2021, após décadas de má gestão. Mas o impacto que Pelé teve no futebol americano é sentido até hoje – em 1994, sediaram uma Copa do Mundo e em 2026 serão sede pela segunda vez. O legado eterno do Rei se estende pelo mundo todo.