Casadas com o Crime – Histórias do PCC

R$83,00

POR THOMAS TOSCANO

Livro-Reportagem de Josmar Jozino aborda o quotidiano e as dificuldades de mulheres envolvidas com o crime

Desde presidiárias até esposas de criminosos, situação das mulheres torna-se uma evidência do precário sistema de segurança pública do Brasil

“Até que a morte nos separe” é daquelas frases que se tornaram mais protocolares do que literais. A cada 100 casamentos no Brasil, nove terminam em divórcio – e os números só aumentam com o passar dos anos. Dívidas, desentendimentos e até mesmo filhos pequenos são razões comuns para divórcios. Todas essas são razões muito menores do que a prisão.

No livro Casadas com o Crime, do jornalista Josmar Jozino, são abordados os casos de famílias que decidem se manter unidas mesmo com o encarceramento de uma das partes dos casais, por exemplo. A investigação do repórter parte do ponto de vista feminino: das mulheres que fazem de tudo para visitar seus maridos, trazendo no colo, por vezes, outros filhos concebidos durante visitas íntimas na própria prisão. São mulheres que não desistem de seus homens. Há casos também de mães lutadoras que não abrem mão de seus filhos encarcerados e na vida do crime.

Casadas com o Crime descreve histórias de mulheres envolvidas não só com os criminosos, mas com o crime em si. Longe de seus maridos e sem sustento, são levadas a entrar para o submundo da marginalidade e em muitos casos também acabam presas. Passam a viver a mesma rotina difícil e dura, mas agora longe de seus cônjuges, e sofrem os problemas da superlotação, da falta de higiene e da ausência de cuidados na prisão.

A narrativa começa acompanhando a rotina de Branca, empregada doméstica que se apaixonou por Medonho, ladrão de lojas de grife. Os dois vivem momentos de romance até o bandido foragido ser encontrado e capturado pela polícia. Depois desse ponto, todo o romance se torna drama e angústia, enquanto Branca lida com sua nova realidade em volta do crime.

Josmar Jozino, além de coletar histórias reais, dá sutileza aos eventos com seu olhar observador. “Eles não pareciam mais um casal de namorados, mas marido e mulher. Às 17 horas, terminou o horário de visitas e Branca teve de ir embora. Ambos se despediram. Ela chorou muito, mas prometeu nunca abandoná-lo na prisão. Medonho também ficou triste na cela vazia e silenciosa. Ele esperou a mulher sair para enxugar as lágrimas. Não chorou na frente dela”.

Aos poucos Branca vai conduzindo a narrativa e se apresentando ao leitor, assim como faz em relação a outras presidiárias com quem passou a conviver. Cada uma vem de uma realidade diferente, com dificuldades de vida diferentes, agora unidas pelo crime. As mulheres que viajam de “caravana” até os presídios passam a conviver e fazer amizades, criam os filhos uma das outras juntas. E as crianças, que só conseguem ver os pais nas visitas, crescem sem perspectiva de estudo e futuro. Algumas, quando têm a chance de conviver com o pai em liberdade condicional, acabam por perdê-los para sempre nas mortes que viram estatística.

A realidade dura dessas mulheres não é exagerada ou distorcida pela narração do repórter. Atentando-se a fatos reais e contando as coisas como elas realmente são, Josmar Jozino é capaz de emocionar, criar laços afetivos e dar um choque de realidade em quem lê seu livro. Afinal, tudo isso acontece diariamente em todas as capitais do Brasil. Uma realidade escondida, mas permanente em nossos presídios. Aqui vale um pequeno spoiler. Branca, depois de anos visitando o marido, passa a visitar a filha mais velha, também condenada à prisão.

Em Casadas com o Crime, a realidade é escancarada, mas sem deixar de ter momentos de beleza e de registros do amor conjugal e materno: mesmo em condições adversas, as mães do livro são mães como qualquer outra, que prezam pelos filhos acima de tudo. Nicole, uma das presidiárias, resume muito bem o tema central da narrativa. “Eu era mulher de um preso. Mas nos separamos! Agora, sou casada com o crime. E nesse novo casamento, a separação só vem com a morte.”

SERVIÇO
Livro: Casadas com o Crime
Autores: Josmar Jozino – Foto capa: Robson Fernandjes/AE
Editora: Letras do Brasil
ISBN: 978-85-61469-01-6
Páginas: 320
Preço: R$ 83,00

Descrição

Casadas com o Crime narra a trajetória de mulheres que passaram boa parte de suas vidas em presídios de São Paulo, seja como visitantes de maridos, filhos ou filhas, seja na condição de encarceradas. Trata-se de um relato jornalistico obtido de dentro das cadeias, com riqueza de detalhes, mas sem partido ou defesa. Todas as informações deste livro são reais. Nenhuma história foi inventada. Casadas com o Crime ganhou Menção Honrosa no Prêmio Vladimir Herzog e finalista do Jabuti.

Beijos com gosto de pólvora
O seu jeito simples, tímido e fiel às origens, sem nunca cair na ilusão e no falso foguetório da glória jornalística, engana ou despista muita gente do ramo. Mas para quem acompanha a trajetória de Josmar Jozino e o seu calhamaço de investigações nas últimas décadas, tanto como leitor como camarada de trabalho, não resta a menor dúvida: estamos diante de um repórter dos mais raros, dos grandes mesmo…
Primeiro jornalista a trazer à tona os movimentos iniciais do PCC em São Paulo, Caveirinha, como é chamado pelos amigos, é um dos mais importantes narradores e testemunhas da crise de segurança pública e do caos da violência urbana no Brasil.
Repórter policial, para usar o jargão mais clássico, nunca se limitou aos B.Os. e aos documentos oficiais. Por esse motivo, lembro muito bem, até despertava broncas e queixas das autoridades. Casadas com o crime supera o bom livro anterior do próprio Jozino, o “Cobras & Lagartos” (editora Objetiva), que narra bastidores da formação e das ações do PCC dentro e fora do sistema carcerário. Com a mira e atenção nas mulheres que tiveram algum tipo de envolvimento com os protagonistas do Primeiro Comando da Capital, fontes essenciais, o repórter-escritor nos revela, ao melhor estilo do naturalismo-realista, a história privada da facção. Mostra como, depois da cortina dos encontros íntimos e até de casamentos em que o beijo dos noivos era proibido, o amor e o crime andaram sempre de rostos colados. História demasiadamente humana e decifradora de segredos nada óbvios, este livro, mais do que os grandes filmes recentes do gênero, exibe a dimensão nelson-rodrigueana da existência.
Xico Sá, escritor e jornalista

Sobre o autor
Josmar Jozino é jornalista desde 1984, especializado em reportagens policiais. Formou-se em Jornalismo pela Universidade de Mogi das Cruzes e em História na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Já atuou nas principais emissoras de rádio de São Paulo como redator e editor. Trabalhou também em jornais: Folha Metropolitana de Guarulhos, Diário Popular e Diário de S.Paulo. Atualmente é repórter do Jornal da Tarde, do Grupo Estado. Em 1988, iniciou sua experiência na reportagem policial no Diário Popular. De 1990 a 1995, passou pelas principais emissoras de rádio. Em 1995, retornou ao Diário Popular. Em 2000, foi agraciado com menção honrosa do Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos. Em 2005, conquistou o prêmio pela segunda vez com o livro ‘Cobras & Lagartos’. Jozino foi um dos primeiros a divulgar a existência do Primeiro Comando da Capital, uma das principais facções do crime organizado no País